segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Propaganda persistente


Propaganda é uma coisa delicada. Tive agência durante muitos anos e sei das dificuldades. Comunicação em massa.
Presto muita atenção até hoje e critico. Agora como consumidor.

Grita em minha cabeça a propaganda de remédio:

AO PERSISTIREM OS SINTOMAS O MÉDICO DEVERÁ SER CONSULTADO.

Esta frase é um crime contra o próprio produto. Por um pequeno detalhe, um “O”, de “AO”. Ao dizer isso, está determinando que os sintomas vão persistir. É o mesmo que dizer “QUANDO PERSISTIREM OS SINTOMAS...”. É como que dissessem que eles sabem que o remédio não serve pra nada mesmo, e, quando os sintomas persistirem, o que eles já sabem que ocorrerá, aí sim, um médico de verdade, que resolve, deve ser procurado. Querem dizer: "A PERSISTIREM...". Mas não sabem, coitadinhos. Eles não sabem escrever... Ganham milhões e não sabem escrever... Simples assim.

Por estas e por outras, (como também “ABAIXAMOS OS PREÇOS” – eles continuam altos, mas agora na prateleira de baixo - e não “BAIXAMOS OS PREÇOS”, como querem realmente dizer) é que me reviro na cama com a propaganda brasileira, tão falada e premiada por aí.

Os gringos não sabem falar português. É isso aí.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Seu Antônio S/A

Antônio Aparecido de Godoi

Ele é magro, muito magro. Voz grossa do interior. Lá de Amparo. Mãos grandes, desproporcionais. O nariz, nem se fala. Baixinho de fala macia, bonezinho na cabeça. Empreiteiro de pequenas obras, cobra por dia e trabalha direito. Este é o seu Antônio.

Lata de 18 litros de tinta ele carrega sem problema algum. Pinta o teto o dia inteiro, esforçado. Às vezes, de tão concentrado, nem escuta o que a gente diz.

“-Seu Arnaldo: vou fazer os recortes!” – aquele sotaque inconfundível.

Vai fazer cinco dias que este amigo de 67 anos, que parece ter menos, está aqui com a gente. Diz que só bebe aos fins de semana e eu acredito. Ele sai às cinco da manhã de casa – de ressaca não se faz isso.

Disse, brincando, a um amigo publicitário que pintor bebe muito, muito mesmo.
Ele respondeu: “-Estou na profissão errada, então.”

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Foi cômico.

Luis Fernando Veríssimo

Fui dar um Google, curioso: “Cômicas crônicas”
Pronto. Ninguém menos. Luis Fernando Veríssimo com um blog,  “Crônicas cômicas”, o inverso.

Puts, pensei.

Por um lado orgulhoso, idéia parecida com a dele, por outro preocupado, idéia parecida com a dele. Só que tive depois dele, entendeu?

Bom, resolvi não esquentar porque me preocupo mais com meu caráter do que com minha reputação. Eu sei que não copiei. Odeio cópia. Sou ferozmente contra, quando se trata de direito autoral. Criei um slogan para uma conveniência gráfica, uma vez:  
Fiel à imagem. Leal a você. Defendia a qualidade da cópia com lealdade ao autor.

Ainda mais sendo este um dos caras que eu adoro. Ele é muito bom.

Merece colocar seu link: http://lfverissimo.blogspot.com/

Tragicômico? Irônico, isso sim.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

A falsidade do século 21


A chuva de comunicação. Unilateral. Eles ( Net, Vivo, Dell – por exemplo) estão na minha e na sua mentes. Hospedaram-se nelas e de lá não saem. Tem musiquinha, tem propaganda, tem promoção. Eles ficam falando conosco o dia inteiro, do jeito que puderem. Fazem fila para nos vender. Surge até chat ao vivo com gente especializada... Incrível e fascinante mesmo, na hora da compra.

Acabam nos convencendo, né?

Tudo bem, vamos lá. Compramos.

De repente o canal não pega, o telefone não atende, o notebook não funciona. Precisamos inverter o canal de comunicação. Deve ser fácil falar com quem fala comigo toda hora, imaginamos. Eles estão em todo lugar, não é mesmo?

Surge a fila para eles nos atenderem.

É o efeito "enganei um bobo, na casca do ovo".
Como pode ser tão difícil falar com quem vive falando conosco? Eles só falam e não escutam?

Eis que descobrimos o quão exigentes nossos sedutores são. Agora somos deles, devem pensar. Pra que se preocupar? Começa a seleção: torcedores do Flamengo, tecle 1, se quer comprar um Vivo ou Morto, tecle 2, para Internet por Banda de música, tecle 3, para Chiclete com Banana no Natal, tecle raiz de 6x3/7 – 1. Para desesperados, mas nem tanto, tecle 4...

Exigentes, nossos fornecedores. Eles são muito exigentes.

Sem falar no humor dos atendentes, que derrubam a linha com técnicas profissionais, caso não nos comportemos.
Estamos nas mãos dessa nova classe de mão-de obra. O telemarketing "receptivo".
Trabalham para não trabalhar, "criativos". Inventam jeitos de desligar e não serem pegos.

Fantástico.

Cuidado, eles são geniosos, viu?

Isso me lembra a piada do inferno.

O sujeito morreu e foi ver onde queria morar. Testou o Céu, tudo calmo, gente de branco, meditando, música clássica, céu azul, meio careta, até.

Lá no inferno a mulherada de fio dental, música bombando, uísque com Red Bull rolando solto, a maior algazarra. Muito bom.

O cara, é lógico, escolheu o inferno.

Acordou no dia seguinte e estava algemado numa fornalha, sendo chicoteado e obrigado a trabalhar. Se esfalfar.

“-Mas e as mulheres, a música, o clima todo? Estava tudo tão bom...”

Ontem você era prospect, amigo. Hoje você é cliente - respondem.


quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Só pra dizer oi


“-Oi, tudo bem?”

Por que será que a gente pergunta se na verdade não quer mesmo saber?
Na verdade a gente quer saber se nada de muito errado está acontecendo. Se escutamos um simples “-Tudo bem.” está resolvido.
E tem gente que leva a pergunta a sério e responde os porquês do sim ou do não. Daí dá vontade de cobrar aluguel da nossa orelha, porque a pessoa vai longe.
Uma pergunta retórica, que não espera resposta, na verdade. Um ritual que garante que, mesmo com os problemas que todos temos, sabemos que tudo anda bem. Sob controle.
“-Oi, tudo bem?
-Bem, e você?
-Tudo jóia...
-Então tá bom.”

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Uma dica do mercado financeiro


Meu pai morreu cedo. De uma forma relativamente repentina.
Notei que, como outras pessoas, acabei exercendo uma profissão que protege as pessoas deste tipo de risco, assim como vejo o cadeirante defendendo sua classe, por exemplo. Ser consultor financeiro traz uma grata sensação de contribuição. Pensando na prosperidade das pessoas que me rodeiam, tento lhes ajudar, dando algumas dicas.

A diferença entre renda variável e renda fixa:

Muita gente confunde o lugar onde o risco está. Estas duas formas de alocação de recursos têm relação direta com o prazo em que ficarão alocadas. Vamos chamá-las de veículos.
Se você vai a Londres, não usará um táxi, concorda? Se você vai à Avenida Paulista, não pegará um avião. Esta é uma boa metáfora.

Muitos pensam que investir em ações é arriscado. Depende. Se for precisar do dinheiro num prazo curto, pode apostar que é arriscado, sim. Seria como ir de avião à Paulista. Mas, no longo prazo, a renda variável, ações, sempre foi mais rentável num intervalo de sete anos, desde quando a Bolsa surgiu.
Renda fixa serve para se guardar dinheiro do dia-a-dia e de emergência (um caso de demissão ou necessidade familiar, por exemplo).
O dinheiro que você está reservando para sua aposentadoria precisa render e pode se expor mais à volatilidade da renda variável para crescer mais.

A renda fixa no longo prazo é arriscada, pois tende à estagnação financeira, tende a render menos. É como que se você fosse de táxi para a Bahia, por exemplo.

Fica a dica pra quem quer se organizar.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Amor - versão do internauta


Vestiu seu melhor boot. Gastando todos os cartuchos, imprimiu mais ritmo no passo. Não ia ficar de A4, lá no Office. Todos iam ver. Ela estava computador de cabeça. Seria uma senha? Estava desconfigurada, mesmo. Não era vírus também. Estava de IBM, e era pré-datada.
Pensou em convidá-la para um mergulho, mas estava Samsung. Control, Alt, Dell esta idéia. Uma Photoshop naquelas máquinas e depois sorvete? Mas o shopping estava fechado... Reiniciou seu raciocínio. 
Um segundo e-mail depois aparece um mouse correndo pela sala. Ela gritou. Ficou com dor no Adobe, até.

“-Que coisa chat!” , pensou. O bicho fugiu por uma das Windows, feito um Flash Player. Mas ela percebeu que seria salva. Salva como? Ele já estava com as ferramentas.

Com seu tipo itálico, um New Roman, muito viril, a salvaria. Na verdade ele era apenas um Messenger, aspirante a Driver. Nunca Steve em outros Jobs. Ela do diretório. Skype era o limite para ela. Um amor quase impossível. Precisava de uma Declaração de Privacidade, sabia. Que ninguém Note, pensou. Era o único atalho para a área de trabalho, ambiente selecionado.

Olhou em seus olhos.

Click! Yahoo! Ele ficou meio Google, sem falar direito, quando enviou a mensagem, arriscando perder tudo. Quase travou, mas, numa arroba de paixão, estava na nuvem. 

Mas ela não perdeu o sinal. Fariam seu primeiro programa.

Histórias do Benga - 4, Acarajé no Kilt


Depois da balada no O Ponto, uma boate de coroas nos Jardins, a gente ia comer acarajé que uma baiana fazia na porta do Kilt, boate de profissionais do amor, no centro.
Era muito bom este quitute, principalmente depois de se tomar muito uísque a noite inteira. E lá íamos nós, de fogo, é verdade, pra Nestor Pestana, na madrugada do dia 25 de janeiro de 1.984, segundo o Julio Saba, que ia guiando.

Eu sei que depois de comer uns dois ou três, apaguei sentado no banco do Fiat branco que ele tinha. Ele também comeu e voltou para o carro para irmos embora. Estava amanhecendo.Uns minutos depois, abri um olho e vi que estávamos na 23 de maio. Fechei de novo e, de repente, o carro começou a ziguezaguear e cantar pneu. Eu, relutante em acreditar que precisava acordar, vi que a coisa estava séria, pois íamos capotar. Só deu tempo de proteger a cabeça. Capotamos.

O carro deslizou uns metros e parou de ponta-cabeça na avenida.
Já acordado, pulei fora dele e vi que o Julio, meio dormindo, não saía. Puxei-o pela gola da camisa e o tirei pela frente do carro, já sem vidro. Aquilo podia explodir, pensei. O sonho virou pesadelo.

Começamos a recolher o que era nosso do carro, chateados. O Julio blasfemava.
Eis que surge a polícia, achando que o carro não era nosso e que estávamos a depená-lo, como saqueadores.
O policial inquirindo e o Julio dizendo que era sobrinho do Maluf, e eu dizendo que era brincadeira dele pro guarda. Foi uma saia justa.

Minha mão saiu esfolada. As costas dele também, do momento em que o puxei pra fora. A minha chave de casa ficou entre o carro e o asfalto e dissolveu um pouco.
Coitada da minha mãe, Dona Therezinha.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

I'll be back


“-O shopping agradece. Volte sempre.” Pronto. Fiquei cabreiro. Levanta a cancela e saio com o carro, pensativo, e começo a simular a discussão.
Imagino que o inventor desta frase seja espírita – com todo respeito a eles.
“-Volte sempre.”
Lamento. Não será pra sempre que voltarei aqui.
Tenho consciência de minha finitude aqui na Terra. Não posso me comprometer a fazer uma coisa que eu tenho absoluta certeza de que não cumprirei. Tenho palavra.
Portanto quando ouço aquele “volte sempre” me sinto enganado. Fica no ar uma promessa de possibilidade irreal de um “sempre” que não existe. Ilusão pura, como toda a parafernália que nos envolve no consumismo.
Falando nisso, preciso voltar lá.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Quem deseja deseja


E se eu ligo e perguntam:

“-Quem deseja?”

“-Depende do que, amoreco. Eu te desejo, com esta vozinha. Você deve ser saborosa.”

Ou,

“-Deseja quem sente desejo. Agora, por exemplo, desejo desligar o telefone correndo e ir chorar sozinho.”

“-Quem deseja??”, já irritada, porque não “entendi” seu dialeto:

"-Eu. Tudo de bom.”

Existencialismo


Quando eu ligo e ouço "-Ele não se encontra.".
Um turbilhão de conjecturas me vem à mente. Fico preocupado. Imaginando.
O que será que deu nele? Estará reavaliando seus valores? Descobriu que sua vida não faz sentido?
"-Ele não se encontra."
Depois de uma jornada da vida... Estaria precisando de apoio? Filosoficamante perturbado? Desde quando ele não se encontra? Esta não é uma pergunta retórica. Fiquei preocupado.
"-Quer deixar recado?"
Diga que estimo as melhoras e que ajudo no que for possível.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

A inveja


A inveja escraviza o invejoso, que se obriga a admirar secretamente o talento alheio. A admiração vence o ódio e o conquista.
Ele sente amor pelo que vê e ódio por não poder esconder o belo que lhe ofusca. Denuncia sua mediocridade.
Relação de amor e ódio que cerra sua boca. Impotência por não poder apagar uma luz que acende. Desejo de tomar para si ou, se não, destruir, apenas.
Traveste-se e engana, sem mostrar sua verdadeira face, para poder trair.
A inveja é uma rota assassina e suicida, kamikaze, se necessário for, pois o invejoso precisa prevalecer.

Wal-Mart especial


Não é de hoje que eu comecei a notar. O Wal-Mart contrata pessoas especiais.
É o máximo, isso. Muitos de seus funcionários, pelo menos aqui no Morumbi, são.
Tem uma moça, anã, que fica no caixa, muito profissional e simpática.
Ontem descobri um rapaz surdo-mudo no estacionamento, organizando os carrinhos. Vários exemplos como estes na loja toda. Graças a Deus o mundo mudou. Pelo menos este mundo. Isto me leva mais vezes à loja. Dá vontade de participar. Colaborar.
Gostaria que todos soubessem que o Wal-Mart contrata pessoas especiais. Isso muda a forma como olho para a marca, para a instituição.
Taí. Comprei.

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Day after



Não tenho muito o que dizer.
Foi sensacional e rápido. Primeiro round.
Uma luta de um golpe só, perfeito. Steven Seagal o ensinou e ele treinou.
Implementou e venceu com ele.
Anderson Silva é um estudioso e esforçado aluno.
Deve ter ido jantar fora depois da luta. Um cineminha com os filhos.
Sem comentários. É de tirar o chapéu.

sábado, 5 de fevereiro de 2011

MMA

MMA

Mixed Martial Arts.

Desde pequeno eu gosto de lutas.
Ficava acordado esperando a transmissão para ver George Foreman, Mohamed Ali... Depois Mike Tyson, que era impressionante.
Foi a era do Boxe.

Apareceu o Vale-Tudo, então. O UFC – ULTIMATE FIGHTING CHAMPIONSHIP.
Antigamente, quando eu via alguém sendo covarde, minha vontade era colocar uma sunga e entrar numa jaula com a pessoa e fazer justiça, de mãos limpas.

E não é que inventaram isto? É assim, este esporte. Numa jaula, com grades, em forma octogonal. Os dois se enfrentam lá dentro.
É o esporte que mais cresce no mundo, entre pessoas com 18 a 35 anos de idade.

E hoje é um dia especial. São 23:00h, agora, e, à uma da manhã, vai haver uma disputa: Anderson Silva X Vitor Belfort. Anderson é uma máquina perfeita. Vitor já foi. É o marido da Feiticeira (Joana Prado). Vamos ver no que vai dar.

Jiu Jitsu, Judô, Muay Tay, Boxe, Wrestling, Karatê, Aikidô e algumas outras modalidades juntas, em combinação.
Hoje é dia de luta. O bicho vai pegar.

Vida de morador


Quando vejo uma foto num ponto turístico, não consigo me esquecer.
Vejo o gondoleiro, o toureiro, nas fotos de seus países e imagino a mesma coisa. Pra eles, moradores, é banal.

Morei no Rio e via o Corcovado todo dia. Corria em Ipanema. Pegava o Bondinho na sexta-feira à noite com uma cerveja na mão. Tinha boate lá no Pão de Açúcar. Fazia academia com atores da Globo, que encontrava na praia também. Na padoca... No banco... Trouxe um amigo de outro país. Ele ficava embasbacado.

Morei na Avenida Paulista. “Uma lenda”.
Na verdade, nada de mais. Tinha a Parada Gay, engraçada. O réveillon...
O maior barulho pra dormir.
Ninguém imagina a vida do morador. Ele indo comprar pão na esquina... É isso que vejo quando olho o carioca, o gondoleiro, o toureiro... Tudo igual todo dia. É a vida de morador.

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Minha tia Sônia


Meus pais construíram a casa de Maranduba e a tia Sônia, irmã dele, fez a mesma planta, espelhada, com um grande jardim entre as duas. As varandas davam vista uma para a outra e não havia divisão. Era um pátio só.

Esta tia levava amigos em sua casa, que acabavam se misturando conosco e uns com os outros de lá e de cá, como de fato deveria ser.
Era moda War, aquele jogo. Eu era pequeno. Não entrava muito nos jogos por isso.

Minha madrinha, a Lurda, me deu um jogo desses, para me posicionar melhor neste ambiente, mais inserido.

Acontece que atravessei para o lado da tia Sônia com o jogo, feliz da vida, querendo brincar. Uma amiga dela (sem nomes, lógico) chegou e começou a fazer um lobby me fazendo de café com leite, para que justo eu, o dono do jogo, ficasse de fora.
Quando percebi a armação, fiquei muito irritado e joguei tudo pra cima e voltei, pisando na grama mesmo.

Meu pai, de sua poltrona, trabalhando na Mirador, uísque e música clássica tocando:
“-Arnaldinho! Não pise na grama!”
“-Piso sim!”, respondi chorando, e fui para o fundo da casa, lá no último quarto.

Meu pai, sabendo que eu não era disso, veio logo acudir. Algo estaria muito errado.
Pra resumir a história, em dois minutos, todas as pessoas, menos esta amiga, hospedadas nas duas casas estavam neste quarto, querendo saber de tudo.

Foi quando a tia Sônia roubou a cena.
Voltou pra sua casa, do outro lado do jardim, e deu um espetacular esculacho nela, dizendo que se fosse para fazer isso, poderia se retirar.

Yes! Tia Sônia é a heroína do dia. Vamos brincar.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Histórias do Benga 3, Fogueiras de Maranduba

Foto: Beco Bresler


Fui buscar lenha no escuro, pela estrada de terra, e quando cheguei em casa, era uma árvore que eu não sabia que trazia nas costas. “- Estava difícil mesmo arrancar isso do chão...”, pensei. Eis que surge do nada a tia Sônia, mostrando a casa dela para um possível comprador, que viu este índio carregando isto pelo caminho. Não devem ter entendido nada. Depois eu garanto que entenderam.

A noite ia avançando e os amigos bebendo. Montava-se a fogueira no meio do jardim entre as duas casas. Mas a lenha não era muita, como deu para perceber.
Meu olhar mudava, o Julio (Saba), de Smoking na praia, como já era seu costume, já sabia: vamos proteger a mobília dele!
O Julio levava camisa social e blazer esticadinhos atrás do carro, pra usar à noite no Castelinho, boate de Caraguá. Um dia falamos só do Julio, dele escovando os dentes... Este tem o que falar.

Voltando à vaca fria, era feita a fileira das cadeiras em frente ao fogo e eu dizia pra primeira: “-Fique na fila, porque você é a próxima.”, diz o Julio, hoje em dia.

As meninas de Goiânia - que, diga-se de passagem, estávamos arrependidos de ter convidado - sem entender nada. Ficamos preocupados em agradá-las, pois elas chegaram com uma mala gigantesca, sem data para ir embora, e tínhamos sido nós que insistimos muito para elas virem. Mas já estávamos de saco cheio, esta é a verdade.

De consciência pesada e a fim de dar risada ao mesmo tempo, começamos a tentar relaxar com a situação.

“-Vamos Cantar?”, falei.
“-Já sei: vocês cantam e eu danço. Ou eu canto e vocês dançam?!”
“-Nós cantamos e vocês dançam!”, vem o João. “-Vocês cantam e nós dançamos!”
“-Um canta e todos dançam!”, “-Todos cantam e um dança!”
“-Ninguém canta e todos dançam!”, “Todos cantam e ninguém dança!”
“Todos cantam e dançam!”, “-Ninguém canta e ninguém dança!”...

E fomos propondo, dando muita risada, até o sol raiar...
O palco das fogueiras

Os Jabutis no meu jardim


Pra quem não sabe, meus pais foram escritores.
Minha mãe teve mais de 180 obras publicadas pela editora Melhoramentos. Meu pai trabalhava lá.

Ela adaptou Moby Dick; Alice no País das Maravilhas; Ali-Babá e os Quarenta Ladróes; Sinbá, o Marujo, dentre muitas outras obras conhecidas internacionalmente. Sempre para público infantil e jovem.
Seu nome é Maria Thereza Cunha Di Giacomo

Escreveu Bitu, o Carneirinho Sujo; O Burrinho Verde; Rique-Roque, o Ratinho Sonhador (prêmios Jabuti e Lourenço Filho – troféu Ouro). Escreveu também As Lendas Brasileiras, que também ganhou um Jabuti, e Mar sem Porto, livro de poesias. Pelo Conjunto da Obra, ganhou o Lourenço Filho - troféu Platina.

Meu pai escreveu Eulália Neutra e Villa-Lobos, Alma Sonora do Brasil (prêmio Jabuti). O próprio Villa-Lobos se envolveu no projeto.
Também dirigiu a Enciclopédia Mirador (uma espécie de fusão entre a Brittanica e a Barsa, pra quem se lembra).
Desenvolveu Uma Política Integrada do Livro (anteprojeto da lei do Livro) e sempre procurou defender a oportunidade de todos os brasileiros, principalmente os mais jovens, de ler.

Postumamente foi consagrado membro da Academia Brasileira de Literatura Infantil e Juvenil, com seu busto o homenageando, sendo representado por minha mãe, bem como Patrono de Biblioteca, Escola, e uma rua ostenta seu nome.

É com muito orgulho que uso o seu nome, Arnaldo Magalhães Di Giacomo.

Hoje estão juntos novamente, muito além de meu jardim.

Fica minha homenagem.
Do Arnaldo pai para "Telecita"

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Histórias do Benga - 2, Nass Lang

Tão puros.

Eu e o João, os dois pestinhas, (pra não dizer o apelido certo que um amigo nos deu) inventamos uma língua própria: Nass Lang (Nossa Língua - seu apelido para o dia-a-dia).

O nome oficial da língua é: Katimuiquilinhóquejólicamentecumiculinhóquejaulícataicacetilsalicílico.
Já se chamou Katimuiquilinhóquejólicamentecumiculinhoquejaulícataicú, mas, como o final obsceno não ficaria bem, mudamos para Katimuiquilinhóquejólicamentecumiculinhoquejaulícataico e, finalmente, para a versão atual.

Tinha um critério básico que era troca de vogais com abreviações e adaptações do inglês - pra simplificar a explicação.
Tun an craitur buzc kai ur truc daí vaigulsh can abravaaiçunsh und aiduptaiçunsh dai ainglhush. (Foneticamente, a frase acima soaria assim).

Era uma forma de nos comunicarmos em público sem ninguém entender nada. Principalmente nossa mãe, dona Therezinha (com Th e z, como ela dizia), que vivia à espreita. Falando-se rapidamente, ninguém entendia.

Ashtuc era uma senha até já conhecida pelos amigos: Take it easy – ashtuc at uz, abreviado. Era pra ficar quieto ou mudar de assunto.
Saig, plash – cigarro, please. (Ela “não sabia” que fumávamos.)
Saig upshturs – vamos fumar lá em cima - Cigarro Upstairs.

Viajando para o Rio, num Cometão, os dois falando Nass Lang sem parar. Falando da careca do senhor em frente, da barriga da mulher ao lado... Essas coisas.
Pelo fato de estarmos falando sem parar, fomos relaxando na pronúncia.
Quando vimos, confundimos a língua e estávamos a “falaire” mal dos outros, imitando o português arcaico, e sendo totalmente entendidos.