quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Minha tia Lurda


Quem me conhece, conhece minha madrinha. A Lurda, tia Lourdes.

Ela sempre me paparicou. Ganhei carros, motos, muita coisa dela, que sempre me tratou como filho. Fez tudo o que pôde e, até, acredito, o que não pôde, por mim. À noite, na infância, ela contava estórias para eu dormir.

O problema é que, desde criança, eu sou notívago. Acabo sempre dormindo tarde.

E minha tia dorme muito cedo e acorda “com as galinhas”, como diz ela, muito cedo também.

Lembro-me dela, coitada, querendo me hipnotizar, contando as estórias, para as quais eu dava até briefing: tinha que ser de cavalo (eu avisava como seria o cavalo, etc.).

Ela contando, dizia “o cavalinho corria, corria, corria...” e eu impaciente, dizia “mas aonde ele chegou, tia?” e ela ia tentando contornar e me fazer dormir.

Numa dessas noites de ar refrigerado no Rio de Janeiro (eu não saía do quarto dela, geladinho, o dia todo, inclusive) eu a extorqui: prometi que dormiria se ela me desse um sorvete de sete bolas – detalhe: tinha que ser de sabores diferentes.

E o tal do sorvete de sete bolas ficou famoso, falado na família. Os rumores: "onde ela irá achar um sorvete de sete bolas para este menino?"

Até que um dia fomos à Colombo, uma casa de chás e lanches muito conhecida no Rio. Quando sentamos e pedimos o tal sorvete, o garçom fez uma cara que ela não gostou nem um pouquinho e disse algo pior ainda. Ele estava “achando errado” ela fazer isto por mim.

“- Muito obrigada. Iremos a outro lugar!” Levantamos e fomos embora.
Naquele momento ela virou minha heroína, como em tantas outras vezes.

Depois só conseguimos achar as bolas de sorvete em separado, mas, para mim, confesso, foi muito mais legal assim.

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